quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

A SOCIEDADE DO ESPETÁCULO

Algumas coisas, simples, muitas vezes me chamam à atenção. São coisas cotidianas, mas que passam despercebidas por aí. Acontecem e é como se não tivessem acontecido ou como se tivessem efetivo e naturalmente ocorrido, mas fossem tão sem importância que ninguém quis dar-lhes um minuto de atenção. Não é porque algo é simples que não tem valor, que não merece ser observada. A simplicidade de uma coisa não reflete o valor que ela encerra.

Eu estava de plantão no estágio do Corpo de Bombeiros e fomos ao encontro de uma criança que havia caído de bicicleta numa rua perto de sua casa e ganhou de presente um corte de 7 cm na cabeça. Oito anos tinha a criança e estava sentada no passeio, encostada no muro, com uma toalha tampando o local da ferida. Uma criança, uma ladeira, uma toalha e no mínimo 30 pessoas na platéia.

A quantidade de gente assistindo à cena foi o que menos me espantou. Esses inesperados ‘shows’ urbanos sempre atraem público assim. Uns mais que outros, mas sempre atraem. Eu mesmo sou um que sou tomado pela curiosidade quando coisas do tipo acontecem. Talvez seja inerente ao ser humano, só não sei se é por simples curiosidade, por sadismo, por piedade ou outro motivo que a psicologia explicaria melhor, bem melhor, que eu.

A irmã do menino estava do seu lado, de pé, chorando, e um tanto quanto assustada, pra não dizer transtornada. Mas mesmo assustada e chorando, e não era pouco, ela tirou o celular do bolso e começou a fotografar o machucado do irmão, assim que o soldado do Corpo de Bombeiros tirou a toalha. Ali, naquele momento, aquela pessoa se dividia entre a irmã, assustada com o acidente e com medo das conseqüências, e uma cinegrafista, que não pode perder a foto para eternizar o fato.

Foi isso que me espantou, que me chamou à atenção, que me fez pensar menos no acidentado naquela hora e desviar meu pensamento para a cinegrafista. Não que ela estivesse errada em fotografar, ou que isso fosse um gesto que mostrasse despreocupação com o irmão. O caso é que são coisas que não combinam, pelo menos na minha percepção. O quase estado de choque dela ficava um instante em stand by e quando a foto já tinha sido feita ele voltava.

Claro que a facilidade do recurso torna esta atitude mais fácil. Se há um dispositivo ao alcance das mãos, por que não usa-lo e registrar a cena para o futuro? Como disse, não creio que seja uma atitude errada por parte da garota, só é algo muito diferente. O acidente do irmão se tornou um espetáculo para as dezenas de pessoas que estavam ao redor olhando e para a cinegrafista, que nas horas vagas era sua irmã. A impressão que deu é que só para quem estava socorrendo que o socorrido tinha mais importância que o ocorrido.

Levamos o garoto para o hospital, foram também a mãe e a irmã. A mãe chorando e sendo consolada pela irmã, que também estava chorando e entre um soluço e outro, tirava mais fotos. Tomara que as fotos sirvam ulteriormente para que ele não ande mais de bicicleta sem freio. Sim, estava sem freio. Mas pelo menos o celular não estava sem bateria.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

AS CHAVES DA PRISÃO


Desde sempre estamos presos. Presos por alguns poucos que dizem em todo canto que somos livres, que podemos escolher nosso destino, que temos o voto. O voto, porém, está longe de fazer cair todas as grades que nos cercam. Pode ser o começo, pode até ser a chave, mas não adianta colocar a chave na fechadura se não houver vontade alguma em rodá-la.

Que o voto é um direito muito importante que temos, não tenho dúvida, assim como não questiono a importância que ele tem na efetividade da nossa cidadania. O que se deve questionar é que a mídia, a grande (pequena?) mída fala do voto como se fosse a única e principal forma de exercer a cidadania. O voto é esporádico, a exploração e a corrupção é diária, é interminável, é convarde.

De nada adianta votar e ficar 4 anos sem se preocupar com o que acontece na política. Essa alienação que, infelizmente, impera na sociedade é uma sensação de liberdade, que é imensamente pior que estar preso. Liberdade mesmo é protestar, é cobrar, é se indignar. Em resumo, liberdade é pensar. E não precisa ser nenhum gênio para pensar, basta querer. Basta olhar ao redor, ver o que está errado e o que precisa melhorar. Drummond disse que "cego talvez é quem esconde os olhos embaixo do catre". E o que não falta hoje em dia é catre para se esconder.

Além dos que nos querem apenas pensando que somos livres, existem outras pessoas que fazem um grande desfavor para a sociedade. São os famosos bajuladores, essas pessoas que fazem de tudo para pegar algumas migalhas que caem lá de cima. Defendem os seus "patrões" com todo afinco, usam da ignorância alheia para passar inverdades atrás de inverdades. Além de serem coniventes com o que é feito nos corredores e porões dos castelos, ainda usam de má fé para ludibriar o povo.

O voto pode até se a chave que nos tira dessa prisão, mas o que faz com que a chave abra a fechadura é nossa presença, nossa cobrança, é nosso olhar atento a tudo que acontece. Só nossa insistência em combater a corrupção é que vai realmente nos libertar. Apesar de cada vez mais aumentar o número de gente que só se preocupa com sua conta bancária, com seus prédios, suas fazendas, seus empregos, os bons ainda são a maioria. Não adianta, contudo, ser maioria e não agir.

P.S.: texto descarademente inspirado pelas músicas 'Somos quem podemos ser' e 'O exército de um homem só II', dos Engenheiros do Hawaii, no poema 'Confissão', do itabirano Drummond e na política de um pseudo-feudo qualquer.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

FINANCIAMENTO DE CAMPANHA: UM TEMA A SER PENSADO

Quem viu as declarações de bens dos nossos candidatos e suas previsões de gastos já deve ter se indagado de onde vem esse dinheiro. E logo em seguida se questionado sobre qual a melhor forma de se fazer uma campanha. Com dinheiro público, privado ou misto?

Não sei qual a melhor forma, qual a forma ideal. Um financiamento privado é menos oneroso à população (será mesmo?), mas dá chances desiguais aos candidatos. Quem tem mais influência, quem tem amigos mais abastados leva vantagem sobre quem não tem tanta influência assim. Seria cada um por si. Mas a troco de quê uma pessoa, uma empresa investe milhares, centenas de milhares de reais numa campanha política? Seria simplesmente por caridade ou ela vai querer um ressarcimento após a eleição, onerando assim a população?

E quando o financiamento é público a primeira coisa que vem à cabeça do cidadão é que estão gastando o dinheiro que poderia ser investido em saúde, educação, segurança e tudo mais. Mas, sendo os gastos das campanhas todos bancados pelo poder público, não seria mais justo? Não seriam dadas condições iguais aos candidatos? E além disso, acredito que não ficariam devendo favores a nenhum amigo que resolveu investir seu precioso dinheiro na campanha.

Fica então essa dúvida. Qual modo pesa mais sobre o bolso da população? Apenas o Estado (nós) financiando as campanhas, pois assim poderemos ter mais certeza de quanto estamos pagando, ou campanhas a base de doações, que por ventura serão ressarcidas (por cima ou por baixo do panos) após a eleição?

quinta-feira, 8 de março de 2012

TODO DIA (AINDA É DIA)

Deve-se sim parabenizar e render homenagens às mulheres no dia de hoje. Mas só isso é suficiente? Apenas uma vez no ano se dar ao trabalho de enchê-las de elogios e palavras doces? De nada adianta apenas um dia ser festejado, serem as mulheres colocadas no céu ou num mar de rosas e no resto do ano não se dar ao trabalho de agir com respeito, educação e carinho. O mínimo que uma pessoa deve fazer para qualquer outro seu (des)semelhante.
A mulher tem com certeza seu papel na história. Para os que creem, elas são culpadas pelo pecado. Para os cristãos da idade média muitas eram bruxas e serviam de combustível para as fogueiras da Inquisição. Para algumas religiões são seres cobertos, escondidos por baixo de misteriosos trajes, que deixam passar apenas o olhar intrigante de uma pessoa presa por concepções alheias.
As maçãs já acabaram e junto com elas o paraíso. As fogueiras se extinguiram e as mulheres não são mais submissas, ou pelo menos não deveriam ser. Em alguns países as mulheres ainda são tratadas de forma cruel, com inúmeras limitações. Inúmeras regras que as proíbem de fazer coisas simples e que as pune rigorosamente, muitas vezes com a morte, quando fogem da linha, por assim dizer.
Isso assusta todo mundo. Ativistas se manifestam por toda parte, levantando a bandeira da igualdade sexual, da igualdade de direitos, pelo fim da violência contra as mulheres etc. Não que esses manifestos não devam existir. Devem sim e cada vez em maior número. O que não pode é a gente gritar pela vida da pobre mulher condenada à morte por apedrejamento e nos esquecermos das nossas aqui que morrem todo dia, bem do nosso lado.
Quantos maridos, embriagados ou não, espancam suas esposas e suas filhas todo dia nessa imensidão de país e a gente não faz nada. Até finge que não acontece. E os assédios sexuais pelos patrões, a violência física e psicológica por que passam milhares de mulheres, e muitas vezes em silêncio. Silêncio imposto pelo medo de gritar e não ter quem às socorra.
O senado aprovou, ontem, um projeto de lei que prevê multa para as empresas que pagarem às mulheres salário menor do que é pago aos homens que ocupam o mesmo cargo. Surge uma grande dúvida aí. É algo a se comemorar ou para se entristecer? Comemorar, pois é um conquista, se entristecer, porque estamos já no século XXI, já fomos à lua e ainda não nos demos conta de que não existe diferença entre a capacidade do homem e da mulher.
É preciso que a comemoração, não só do dia internacional da mulher, mas do dia das crianças, das mães, dos pais e tantos outros seja feita todos os dias. Todo dia o ser humano merece respeito. É preciso que essa sazonalidade acabe. Senão ficaremos iguais nossos queridos políticos. Aparecem quando interessam e depois se esquecem, ou fingem se esquecer, do povo.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

FICHA LIMPA, MÍDIA NEM TANTO

A primeira lei de origem popular foi aprovada pelo Supremo Tribunal Federal para que tenha efeito já nas eleições municipais deste ano. A lei da ficha limpa promete começar uma grande faxina na política brasileira. De imediato já não permite que os políticos condenados por um colegiado, mesmo que ainda haja possibilidade de recurso, e os que renunciaram ao mandato para não serem cassados se candidatem. Neste grupo também estão os que tiveram as contas rejeitadas.
Além de impedir que os condenados entrem, ou melhor, mantenham-se na política, afundem cada vez mais suas raízes nas casas parlamentares, a lei faz com que quem está lá e não cometeu nenhum ato ilícito ainda pense duas, três, dez vezes antes de cometê-lo. As pessoas já não verão mais a política como um meio fácil de ganhar dinheiro e uma terra sem lei.
“Todo poder emana do povo”, é o que diz a nossa constituição. O STF fez valer essa máxima. Uma lei baseada na assinatura de mais de um milhão de pessoas e na vontade de outros milhões que não assinaram não poderia mesmo ser barrada pela justiça. E tinha sim que valer o mais rápido possível, como foi feito.
Pena que a grande mídia não deu tanta atenção para essa grande vitória do povo. Havia outras coisas que julgavam serem mais importantes. Às vésperas do carnaval, o foco não podia ser desviado dos preparativos, das fantasias (ou falta delas), do barulho, dos camarotes, das bebidas, da alienação.
E tirar completamente o foco da decisão tomada pelos ministros do STF, por 4 dias os jornais e sites só falavam do julgamento do tal Lindenberg. Os jornalistas não saiam da frente do fórum de Santo André. Parece que no Brasil não estava acontecendo mais nada. Não que o julgamento não merecesse atenção, até porque nesses casos o povo espera uma resposta da justiça. Espera que realmente seja feito justiça.
O povo precisa sim de diversão, carnaval, futebol, música e afins. Mas precisa mais ainda de informação. E informação de qualidade e verdadeira, não informações tendenciosas. O povo precisa sim de diversão, mas não podem usar essa diversão para aliená-lo. A TV mostra apenas o que ela quer, o que lhe interessa que seja mostrado. O carnaval, o julgamento, o reality show e se sobrar um tempinho, a fica limpa. E aí fica-se sempre na dúvida: de que lado eles estão?

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

O PÃO, O CIRCO E A CERCA

A polícia foi chamada para acompanhar o diretor do setor de tributação da prefeitura até à rua João Gonçalves da Costa. A rua havia sido fechada, pela segunda vez, como sinal de protesto pela situação calamitosa que a rua se encontra. A promessa era de que em 90 dias a rua seria asfaltada, mas o prazo venceu e nem sinal de pavimentação apareceu por lá. A promessa é de que quantas vezes a cerca for retirada ela será refeita.
A argumentação é de que os moradores estão infringindo a lei. Estão tirando o direito dos outros de ir e vir ao fecharem de tal forma a rua. Porém só se tira algo que já exista. Não tem como tirar das pessoas o que elas não têm. Na referida rua já não existe mais possibilidade de ir e vir. A não ser que a pessoa esteja disposta a sujar, e muito, seus pés, não tem como passar pela rua.
E quem foi que deixou a rua chegar nesse ponto? Será que foram os moradores que impediram a prefeitura de cuidar da rua, de asfaltá-la, de calçá-la ou foi a prefeitura que, por motivo que não sabemos, não pavimentou a rua? Quem infringiu a lei primeiro foi o governo. Quem tirou dos moradores o direito de ir e vir foram as administrações passadas e atual.
Nas duas vezes que a rua foi fechada a prefeitura respondeu prontamente, como se quisesse mostrar autoridade, mostrar que na cidade há regras, que há hierarquia. Pena que esta prontidão não foi vista para consertar a rua também. Não só a rua, pois como bem frisaram os moradores, o protesto, apesar de ser localizado, é para chamar a atenção para a situação de todos os 4 bairros da região.
Quando era para prometer, o prefeito foi lá pessoalmente. Quando foi para desmanchar, foram representantes. Nem satisfação tiveram. O estrago na rua não é culpa da atual administração, é problema antigo. Mas quem prometeu foi o prefeito atual. Aqui no Brasil as promessas deveriam ser registradas em cartório com cláusulas de não cumprimento. Pagar multa quando as promessas não forem cumpridas, quando os asfaltos ruírem e quando o pão chegar no circo.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

A MAGIA DOS MAGOS

Em meio a tanta espera pelo salvador o menino nasceu. Nasceu bem longe, escondido de todos os holofotes e paparazzi. E rumo ao bebê foram os magos. Seguindo a estrela guia viajaram dias para presentear o recém-nascido. Três majestades caminhando pelo mundo a procura da resposta que queriam.
Os homens seguem assim também. Andam, perambulam, arrastam-se pelo mundo à procura de resposta. Mas ao contrário dos magos, que sabiam o que encontrariam ao fim da caminhada, estes homens, sapiens por convenção, não sabem o que buscam, se é que ainda buscam. Talvez já desistiram de buscar e continuam andando apenas por incapacidade de pensar em algo melhor.
Tão ruim quando ficar parado esperando que o tempo faça o seu trabalho é vagar por aí sem rumo. E a pergunta que se faz é onde e quando esse rumo se perdeu? Será que havia um mapa e ele foi barganhado em uma esquina qualquer a troco de um punhado de arrogância e outro tanto de esperteza?
Há muito precisa-se que um novo Messias nasça. Pelo menos alguém que finja sê-lo, mas o faça bem feito e com boas intenções. Há muito a humanidade se perdeu e não faz questão nenhuma de se endireitar-se. A rua foi entortada por quem tinha força para tal e os peregrinos seguiram (sem reclamar) o novo e torto caminho.
Hoje o céu abriu, pode ser que ao anoitecer apareça alguma estrela, que, comovida com nossa falta de rumo, resolva nos orientar. Orientação sem sensacionalismo, sem partido, sem dízimo, sem promessa e sem segundas intenções. Pode ser que por milagre divino, ciência humana ou magia real os homens (re)descubram o significado e o valor de humildade.